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Trissomias: entenda o que são e quais são os tipos mais comuns
Luiza Chaves - Biomédica MSc
13 de agosto de 2024
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Trissomias: o que são?
O padrão da normalidade do cariótipo humano (conjunto cromossômico) é caracterizado pela presença de duas cópias de cada um dos nossos 23 cromossomos, um de origem materna e um de origem paterna, totalizando 46 cromossomos.
Qualquer mudança nesse número de cópias, tanto para mais ou para menos, é considerada uma alteração cromossômica, ou aneuploidia. Quando há a presença de uma cópia extra de um cromossomo, tal alteração é classificada como uma trissomia, enquanto a presença de apenas uma cópia é classificada como monossomia.
A maioria das aneuploidias não possui compatibilidade com a vida, como as monossomias nos cromossomos autossomos (1-22) e trissomias envolvendo os cromossomos de maior tamanho (1-12). No entanto, a monossomia do cromossomo X e trissomias envolvendo os cromossomo 13,18, 21, X e Y podem resultar na manifestação de quadros sindrômicos.
Tipos de trissomias
As trissomias podem ocorrer em qualquer um dos nossos 23 cromossomos, seja os autossomos (1-22) ou os sexuais (X-Y), e normalmente acontecem devido a um erro de divisão celular durante a formação dos gametas parentais (óvulo e espermatozoide) ou a formação do embrião em si. Durante a divisão celular, também conhecida como meiose, é necessário que os cromossomos se agrupem no meio da célula para que sejam separados e divididos em duas células filhas. No entanto, podem ocorrer eventos como a não disjunção cromossômica, no qual os cromossomos não se separam de maneira correta e acabam resultando em células filhas com cromossomos a mais ou a menos.
Sua frequência aumenta exponencialmente quando associada ao avanço da idade materna (35 anos ou mais), que resulta na diminuição da qualidade dos óvulos e facilita a ocorrência de erros na divisão dos cromossomos e formações de aneuploidias. Com o avanço da idade da mulher há uma maior tendência a ocorrer degradação de proteínas responsáveis por manter os cromossomos unidos e alinhados, também chamadas de coesinas, assim como do ponto de checagem do fuso meiótico que previne a separação incorreta dos cromossomos, e alterações nos níveis de condensação cromossômica devido à modificações de histonas, resultando em um maior número de erros no processo de divisão.
As trissomias mais conhecidas são aquelas que possuem maior frequência populacional e/ou compatibilidade com a vida, como as citadas a seguir:
Trissomia do cromossomo 13 (Síndrome de Patau)
A trissomia do cromossomo 13, ou Síndrome de Patau, ocorre devido a presença de três cópias do cromossomo 13, totalizando 47 cromossomos.
A condição, com frequência de 1 em cada 5.000 recém-nascidos, resulta em um quadro grave, associado a malformações congênitas e menor expectativa de vida, com sobrevida média de dias, assim como perdas gestacionais. A síndrome é caracterizada por defeitos cerebrais, fenda palatina, dismorfismos faciais e oculares, cardiopatias, baixo peso ao nascimento, malformações abdominais (onfalocele), polidactilia e baixo tônus muscular (Wyllie e col., 1994; Patau e col., 1960; Peroos e col., 2012; Cotta e col., 2022).
Trissomia do cromossomo 18 (Síndrome de Edwards)
A trissomia do cromossomo 18, ou Síndrome de Edwards, ocorre devido a presença de três cópias do cromossomo 18, totalizando 47 cromossomos.
A síndrome, com frequência de 1 em 3.600-10.000 recém-nascidos, resulta em grandes complicações de saúde e diminuição da expectativa de vida, sendo em média de alguns meses. Além disso, também apresenta associação a abortos espontâneos e sintomas com variabilidade de severidade, como malformações congênitas, deficiência intelectual, atraso do desenvolvimento, dismorfismos craniofaciais, defeitos cardíacos, baixa estatura e microcefalia (Tucker e col., 2007; Fitas e col., 2013).
Trissomia do cromossomo 21 (Síndrome de Down)
A trissomia do cromossomo 21, ou Síndrome de Down, ocorre devido a presença de três cópias do cromossomo 21, totalizando 47 cromossomos.
A síndrome de Down é a alteração cromossômica com maior frequência populacional, afetando cerca de 1 em 1.000 recém-nascidos. Algumas de suas características são orelhas de baixa implantação, fácie característica, olhos amendoados com fissuras palpebrais inclinadas, fenda palmar, defeitos cardíacos congênitos, alterações do trato gastrointestinal, baixa estatura, deficiência intelectual e atraso do desenvolvimento neuropsicomotor (Antonarakis e col., 2020; Akhtar e Bokhari, 2023).
Trissomia do cromossomo X (Síndrome do Triplo X)
A trissomia do cromossomo X, ou Síndrome Triplo X, ocorre devido a presença de três cópias do cromossomo X, totalizando 47 cromossomos.
A condição, com frequência de 1 em cada 1.000 meninas nascidas, é conhecida pelas características de alta estatura, baixo tônus muscular, deficiência intelectual, atraso do desenvolvimento motor e de linguagem, distúrbios psicológicos e alterações genito-urinária como falência ovariana prematura, irregularidades menstruais e infertilidade. No entanto, muitos casos têm manifestação mais branda ou são assintomáticos (Tartaglia e col., 2010; Otter e col., 2010; Afshan, 2012).
Trissomia dos cromossomos sexuais XXY (Síndrome de Klinefelter)
A trissomia XXY, ou Síndrome de Klinefelter, ocorre devido a presença de cópias extras do cromossomo X em meninos, totalizando 47 cromossomos ou mais.
A condição, com frequência de 1 em 500 meninos nascidos, é conhecida pela associação a sintomas como ginecomastia, deficiência intelectual e de linguagem, alta estatura, hipotonia, baixa densidade óssea, infertilidade, alterações genitais e esqueléticas, puberdade tardia e quadris largos. A severidade da condição possui associação à quantidade de cópias extras do cromossomo X presentes no indivíduo (Pattamshetty e col., 2020; Vorsanova e col., 2020).
Trissomia dos cromossomos sexuais XYY (Síndrome de Jacobs)
A trissomia XYY, ou Síndrome de Jacobs, ocorre devido a presença de uma cópia extra do cromossomo Y, totalizando 47 cromossomos.
A condição, com frequência de 1 em 1.000 meninos nascidos, apresenta características como alta estatura, deficiência intelectual e de linguagem, distúrbios comportamentais, crises convulsivas, macrocefalia, tremores musculares e escoliose (Ross e col., 2012; Bardsley e col., 2013; Sood e Fuentes, 2022).
Diagnóstico de trissomias
A presença de alterações cromossômicas pode ser identificada por exames citogenéticos, como o cariótipo banda G, e moleculares, como o MLPA e Array. Também é possível realizar sua investigação ainda no período pré-natal, por meio de teste de triagem, como o NIPT (Teste Pré-Natal Não Invasivo), ou testes diagnósticos, por meio da análise de vilosidades coriônicas ou líquido amniótico.
Na sua grande maioria aneuploidias são um evento esporádico, ocorrendo sem nenhum fator de risco causativo. No entanto, alguns casos podem ocorrer devido a presença de alterações cromossômicas parentais assintomáticas que acabam passando despercebidas, como translocações ou inversões, portanto é indicado que seja realizada investigação familiar mediante diagnóstico de alterações cromossômicas como as trissomias.
A investigação de aneuploidias deve ser orientada por profissional de saúde capacitado, e é recomendado que pacientes passem por consulta de aconselhamento genético para esclarecimentos quanto a condição, suas causas, riscos de recorrência e planejamento familiar.
Referências:
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Luiza Chaves - Biomédica MSc