Genética

Genética e COVID-19: a relação do vírus com a genética humana

Ms. José Eduardo Levi

Compartilhe este artigo:

Por Ms. Jose Eduardo Levi e Dr. Guilherme Yamamoto

Após muitos estudos científicos, hoje temos mais clareza das influências da genética tanto do próprio coronavírus como dos fatores de risco genéticos dos pacientes infectados na resistência e progressão da COVID-19.

Devido ao avanço das técnicas de laboratório que fazem sequenciamento (teste) de DNA, hoje conseguimos investigar tanto o vírus como os hospedeiros (humanos ou não) de maneira muito mais barata e rápida.

Por isso reunimos aqui algumas das principais dúvidas e respostas que existem em relação à importância dos fatores genéticos e a COVID-19.

Casos graves de COVID-19 associados ao perfil genético dos pacientes

Como qualquer doença infecciosa, existe um componente genético na resposta ao Covid-19, ilustrado por famílias que convivem proximamente e apenas um dos membros se infecta, por exemplo. 

Muitos estudos extensos já foram feitos e existe uma correlação de gravidade da Covid-19 com um trecho do cromossomo 3. Neste cromossomo, alguns genes-candidatos estão presentes e existe uma relação marginal com grupos sanguíneos. Indivíduos do grupo O tem proteção à infecção enquanto que no grupo A maior suscetibilidade – embora estas diferenças de proteção e suscetibilidade sejam muito pequenas. 

Curiosamente, não se encontrou qualquer associação, positiva ou negativa, entre os genes do HLA (Human Leukocyte Antigen), que comandam a resposta do sistema imune aos agentes infecciosos como os vírus da Covid-19. 

Vale lembrar que o SARS-CoV-2 está presente em TODOS países e populações do globo, demonstrando portanto que, mesmo que possa haver alguma modulação pela genética do hospedeiro, não é algo determinante.

Como a análise do sequenciamento genômico do coronavírus pode ajudar no combate ao vírus?

O sequenciamento do genoma do vírus permite o monitoramento das mutações que inevitavelmente acontecem. Através de dados múltiplos, é possível saber se tais mutações são neutras para o vírus ou se tem potencial em modificar características biológicas, como a taxa de transmissão ou de replicação.

Dessa forma, podemos antecipar medidas de prevenção e contenção e adotá-las nos locais e intensidade onde sejam identificadas estas variantes virais com eventuais mutações de atenção. Além disso, é possível que para algumas das novas variantes nem todas as vacinas sejam igualmente eficientes. Saber quais localidades estão com mais casos destas variantes poderia ajudar na escolha de quais vacinas alocar para estas cidades/estados.

Existe relação entre o perfil genético e a resposta à COVID-19?

Não há correlação significativa entre perfil genético e COVID-19 que seja independente dos fatores de risco fortemente associados a COVID-19, como por exemplo obesidade, hipertensão e diabetes tipo 2. Ou seja, os mesmos fatores de risco genético que aumentam a chance de alguém ter obesidade também foram mapeados em pessoas com quadros de COVID-19 mais grave. No entanto, não foram identificados fatores de risco genéticos que são fortemente associados a COVID-19 e não são relacionados a doenças ou sintomas que podemos detectar sem testes genéticos. 

Deste modo, no dia a dia ainda é muito mais importante a avaliação clínica com exame físico e história de doenças da pessoa e família do que testes genéticos para determinar a resposta individual de cada paciente à COVID-19.

Por outro lado, pesquisas com múltiplos pacientes e seus fatores genéticos são muito importantes porque, mesmo que ainda não sejam suficientes para dar uma resposta específica para cada pessoa, os dados agregados podem mostrar vias do metabolismo e tendências nas respostas mais graves, ou leves, que levam a descobertas de medicamentos que podem ajudar, ou devem ser evitados na COVID-19. 

Uma das pesquisas que também utilizou dados genéticos mostrou por exemplo que o uso crônico de opióides parece estar mais associado a quadros graves de COVID-19. 

https://www.medrxiv.org/content/10.1101/2020.12.18.20248319v1.full.pdf

É possível que a vacina do coronavírus cause alterações genéticas nas pessoas vacinadas?

Não. As vacinas de RNA mensageiro (mRNA), como a da Pfizer/BioNtech e a da Moderna, são de fato pioneiras no uso desta tecnologia em humanos em grande escala. Antes de serem usadas para Covid-19 foram extensamente testadas em outras situações. 

O mRNA injetado pela vacina não chega no núcleo das células do músculo onde se aplica a vacina. O núcleo é onde está o nosso DNA, portanto o mRNA nem tem oportunidade de alterar nosso DNA. O mRNA injetado é degradado em algumas horas após a injeção da vacina. 

Já as vacinas de adenovírus, como da Astra-Zeneca/Oxford ou a Sputinik, usam adenovírus que não é capaz de replicar. Nós humanos já somos naturalmente infectados por adenovírus, e nunca se encontrou adenovírus integrado ao nosso DNA, portanto também não é capaz de mudar nosso DNA. 

As vacinas de vírus inativado como a Coronavac/Butantã usam a tecnologia mais tradicional de vacinas já usadas há mais de 50 anos. Um vírus inativado jamais será capaz de modificar nosso DNA, porque ele está inativado, ou seja, seu DNA/RNA é inativo!